Reflexão que versa sobre o registro de contingência contábil vinculado aos riscos de demandas judiciais ou arbitrais, considerando os risco de perda da ação judicial ou arbitral que dividem-se em provável, possível e remota.
O risco deve ser precificado e reconhecido nos relatórios contabilísticos. Portanto, cabe ao profissional de contabilidade, após analisar relatório jurídico e assembleia dos sócios/acionistas, provisionar o respectivo valor ou reconhecê-lo desde logo como uma obrigação no balanço patrimonial e o seu efeito no balanço de resultado econômico, e nas respectivas notas explicativas. As notas explicativas dos balanços vinculadas aos riscos devem indicar as razões e os parâmetros que foram levados em consideração para tal decisão.
Os balanços que desprezam riscos patrimoniais e responsabilidades são meramente putativos e falaciosos. O registro do risco tem respaldo no princípio da prudência, transparência, veracidade, diligência e no da informação. E a existência de risco afeta a precificação de uma eventual apuração de haveres, reembolso de ações, a segurança do mercado de valores mobiliários, e a segurança aos credores, fornecedores, investidores e demais utentes dos relatórios contábeis.
A ocultação da existência de risco gera responsabilidade dos administradores, contadores, advogados, sócios ou acionistas controladores ou majoritários, conselheiros, auditores e demais envolvidos, seja por ação ou omissão, que respondem proporcionalmente a sua participação na ocultação.
O risco está vinculado à razoabilidade, e à probabilidade de ocorrência, da existência ou não de uma obrigação, logo, existência de passivo contingente. O percentual de risco a ser divulgado nas notas explicativas representa a medida do risco de perda, ou seja, de um desembolso futuro, atribuído à uma ação judicial/arbitral provisionável. As hipóteses dos riscos, provável, possível e remoto, consideram além do ceticismo contábil os aspectos favoráveis à tese jurídica e as variadas dimensões quanto à interpretação dada pelos tribunais, e pela doutrina.
A indicação da definição de um risco entre “0 e 100%”, será elaborada pelo advogado e/ou consultor jurídico do contencioso, além de ser aprovada pela assembleia dos sócios/acionistas e conselheiros. A avaliação do risco de perda deve ser feita a partir do fato gerador do risco e deve ser reavaliada mensalmente para se obter uma asseguração de que a avaliação anterior permanece válida. O fim da reavaliação do risco ocorre somente com o trânsito em julgado da demanda.
O negacionismo aos indícios e/ou evidências científicas, em relação à existência de riscos e seu registro na escrituração, é algo abominável no âmbito da ciência da contabilidade e suas teorias. A existência de compliance contribui para a diminuição dos riscos, mas não garantem a sua eliminação.
O risco de perda remota em demandas ocorre quando houver baixo risco de desembolso financeiro, ou seja, a chance de ocorrência da perda da demanda e consequentemente sucumbência, é pequena. Presume-se que um evento passado dá origem a uma obrigação presente ou futura, e ainda que seja com risco remoto, deve ser informado nos relatórios contábeis, esta é a função da contabilidade, portanto, o risco deve ser, levando em consideração na elaboração dos relatórios contábeis, seja no BP como “provisões”, na DRE e nas notas explicativas. E não tipificar contabilmente o fato, utilizando a apologia de ser remota a possibilidade, é um erro material. Enquanto existir o risco, ainda que diminuto, não se paga ou provisione-se lucros/dividendos relativo à parcela deste risco independente do % atribuído ao risco. Este tratamento técnico do provisionamento está vinculado ao princípio contábil da epiqueia contabilística. Admite-se o não reconhecimento do risco no passivo, se em relação a proposição de demanda, o fato gerador do risco e seus efeitos, já tenha ocorrido a prescrição sem a propositura da demanda.
O risco de perda possível em demandas representa um risco intermediário de desembolso financeiro, ou seja, a chance de ocorrência da perda da ação, é maior que a remota e menor que a provável, e devem ser registrados no passivo como uma contingência, e indicado nas notas explicativas a sua classificação como perda possível.
O risco provável de perda em demandas ocorre quando houver risco alto de desembolso, portanto, com a chance de ocorrência do desembolso sendo superior a “possível”. Sendo considerado para tal, “provável o risco” as demandas cujas circunstâncias de precedentes, de jurisprudências, de doutrina e/ou provas contábeis, sejam notadamente desfavoráveis ao réu.
Um perito em contabilidade ou um auditor, verificando a existência de riscos vai propor a sua avaliação com critério científico, pois as ilicitudes praticadas pelo administrador, ou pelo sócio/acionista controlador, implica em um direito da pessoa jurídica de receber tais valores. Entende-se por ilicitudes de um administrador ou sócio/acionista controlador, todos os atos que geram o dever de indenizar por perdas, danos e lucros cessantes, tais como: responsabilidade pelas deliberações infringentes do contrato social ou da lei; evasão fiscal; inclusive a prática de negócios estranhos aos seus fins sociais que resultem em prejuízo; os atos de desvio de poder; fraudes contra os credores da sociedade; o recebimento ou pagamento de lucros ilícitos ou de lucros fictícios; pagamento de propinas a funcionários públicos; desvio de função; abuso da personalidade jurídica; abuso de direito; conflito de interesses; concorrência parasitária ou desleal; desvios de recursos; ou qualquer falta de diligência ou probidade, inclusive corrupção ativa e passiva e todas as formas de fraudes.
É deveras importante realçar, que deve ser registrado no balanço patrimonial, estes efeitos de ilicitudes, contravenções ou crimes, débito no ativo circulante referente a estes valores que a sociedade tem a receber dos sócios ou administradores por irregularidades, e crédito no patrimônio líquido; esta posição tem respaldo na teoria ultra vires e na autonomia patrimonial ditada pelo princípio contábil da entidade. Portanto, o paradoxo é: existindo risco de um passivo contingente, pode surgir deveres dos administradores e sócios, se existir atos de desvio de finalidade. Eis uma questão a ser refletia pelos contadores, pois não se pode afastar a hipótese de balanços maquiados com objetivo de falsear as informações patrimoniais e levar a erro de interpretação os utentes do conjunto das demonstrações contábeis/financeiras. Sem embargos ao fato gerador e vinculante das provisões ativas e passivas, aqui tidas como uma simetria entre dever e haveres, uma coisa são os registros dos passivos contingentes que poderão ser exigidos da sociedade, e outra, são os ativos contingentes que a sociedade pode exigir dos administradores e/ou sócios e acionistas controladores.
E por derradeiro, cabe evidenciar, que a classificação dos riscos nas categorias: remota, possível, e provável, existem para fins de indicação nas notas explicativas e o valor de 100%, correspondente aos riscos, deve ser contabilizado como passivos contingentes, independente de sua classificação de risco. Tal conclusão, tem amparo no princípio da racionabilidade lógica-contábil.As reflexões contabilísticas servem de guia referencial para a criação de conceitos, teorias e valores científicos. É o ato ou efeito do espírito de um cientista filósofo de refletir sobre o conhecimento, coisas, atos e fatos, fenômenos, representações, ideias, paradigmas, paradoxos, paralogismos, sofismas, falácias, petições de princípios e hipóteses análogas.
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